Day by day. · Pensamento soltos traduzidos em palavras.

Tanto tempo se passou. Eu já não passo por aqui com tanta frequência, mas isso não quer dizer que tenha perdido meus sentimentos. Ou meu desejo por colocar tudo pra fora.

Quem sabe eu tenha até desaprendido a escrever, mas tudo o que vivo e vivi carrego aqui dentro. Nos momentos mais sombrios são as lembranças que me guiam em direção a luz.

As vezes, não escrevemos para que leiam, trazemos vida as palavras como forma de travar um diálogo, solitário eu sei, entre a vida que levamos e a vida que levávamos. A gente transborda, por vezes, e o eco repete alto toda aquela vida que sinto saudade.

Sou feliz, tenho lembranças de tudo aquilo o que vivi, isso nem o tempo vai tirar de mim. São outros tempos, dimensões, outras vidas quem sabe. A garrafa que voou da janela a tudo lançou no portal da eternidade!

Recortes de texto de R.M

Day by day.

Diário de quarentena – Dia 66

Peguei-me agora pensando sobre como será o começo da reconstrução de algum mundo possível a partir dos escombros deste que está acabando. Sendo lentamente tragado pela lei da gravidade, qual uma ave centenária.

Vi-me esperando uma carta do passado ou do futuro que nos dê uma pista, alguma trilha.
Tudo se desacelerou, como no tempo em que esperávamos cartas. Isso me acalma. Já é alguma coisa, dentre tantas que me desespera.

Estou sempre perguntando como estão as pessoas que amo. Sempre que sei que alguém continua bem ou se recuperou, me sinto aliviada. Porém, antes de saber a cabeça trabalha em hipóteses angustiadas, quando fica sabendo, descansa.

Por aqui, tá tudo bem também. Todo dia penso no privilégio que é ter um teto, uma cama, a chance de tomar um banho mesmo que gelado (eu amo).

Desde que tudo começou mesmo o mais elementar conforto parece absurdo.

E é.

Então, fico me perguntando como vai ser quando tudo isso acabar.

Desde já, me parece obvio que essa é uma resposta impossível, e é exatamente isso que me anima a tentar inventar uma resposta.

E se há, tudo bem…

Quando tudo isso acabar eu vou continuar me atendo aos pequenos gestos, tarefa essa que só agora me atinei a desempenhar.

Fazer um café forte, como sempre, porque sei que ao primeiro gole ele vai parecer saboroso, como nunca. Vou tomar banho, escolher uma roupa que eu goste, passar perfume.

Mas nada disso vai ser um esforço simbólico, um movimento calculado pra que eu mantenha minha sanidade e não me abandone de mim.

O motivo de tudo isso é que eu vou sair às ruas, e encontrar pessoas.

E caminhar de novo na minha cidade.

Quando tudo isso acabar eu vou bater a porta de casa e dar alguns passos pela rua.

O caminho pisado e repisado vai ser, a um só tempo, inédito e antigo, como a fisionomia dos parentes que só se vê muito raramente nas festas.

Quando tudo isso acabar depois de alguns passos vai certamente haver alguma outra pessoa para se encontrar. E apesar de haver uma enorme chance de que nós nunca tenhamos nos encontrado em nossas vidas, eu vou olhar bem em sua direção e arremessar quatro palavras pequenas e comuns “Bom dia, como vai?”.

Quando tudo isso acabar, a vida terá perdido todo o automatismo. Antigamente dizer “bom dia, como vai?” não significaria nada. Seria uma frase atirada ao ar, com a mesma displicência com que se cospe um chiclete no asfalto, e teria a mesma função das salas de espera dos consultórios dentários, uma espécie de antessala da linguagem. Uma saudação que te faz ganhar alguns segundos preciosos enquanto o real motivo da conversa não aponta no horizonte.

Quando tudo isso acabar as palavras estarão carregadas de sentido, e eu vou dizer “bom dia” querendo dizer “bom dia para se estar vivo”, querendo dizer “é um bom dia, porque neste dia, e não em todos os outros, estamos juntos”.

Depois vou perguntar “como vai?”, porque quero realmente saber se você, adorável estranho, ou estranha, ou estranh@, progride no próprio caminho, porque sabemos bem, ainda mais nos tempos difíceis, que estar bem não é nada trivial.

Quando tudo isso acabar teremos muitas coisas pra reaprender, outras tantas pra inventar.
Haverá novamente dentro e fora.

Poderemos entrar e sair, partir ou ficar, demorarmos mais ou menos ao sabor dos ventos.
E sentir o vento, um prazer que não se descreve, apenas se sente.

Quando tudo isso acabar, seremos outros, choraremos pelos que ficaram pelo caminho. Faremos mutirões de reconstrução reais e simbólicos de pessoas e lugares.

Quando tudo isso acabar nunca mais um vagão de metrô lotado parecerá incomodo, vai sempre ser predominante a alegria de sermos coletivo.

Glória das glórias. Vivos.

Quando tudo isso acabar os sorvetes de casquinha, e as arvores centenárias, e as mesas dos cafés, e as casas dos amigos, e os teatros, bibliotecas, as praças, os parques, os estádios cheios, mas também os vazios.

E quando tudo isso acabar as filas das lotéricas, as agencias bancárias, o passeio público e as aglomerações humanas, lágrimas, suor, beijos, abraços, e todos os clichês serão bem vindos. E nenhum clichê será percebido como tal.

Não haverá mais clichês.

Voltaremos inéditos, redescobrindo caminhos ao caminhar.

Pouco me importa se tudo isso parece fantasioso.

Se parece é porque é.

Mas escolhi imaginar assim, no campo da fantasia, da utopia deslavada. Distopia já temos de sobra.

E esse é a graça de não saber nada sobre as coisas, ficamos livres pra inventar os absurdos felizes.

Espero que estejam todo bem.

Nos vemos quando tudo isso acabar.

Day by day.

Sinto falta da simplicidade dos dias, da leveza dos sentimentos. Do agradável. Sinto falta da espontaneidade. Do inesperado. Do genuíno. Sinto falta de me sentir bem em relação a você, a mim, a nós. Os anos passaram e acho que me perdi no que eu achei que queria.  O peso dos dias tem me feito mal, minhas costas doem. Eu me vejo não querendo proximidade, e sinceramente, não sei até onde isso irá nos levar. Queria que me levasse pro tempo em que eu seria capaz de consertar, lá atrás.

Another me.

Ressurgi.

Às vezes parece que a vida está passando por mim sem que eu tenha tempo de vivê-la. Sem que eu tenha tempo de perceber suas cores, sua vibrações. Sem que eu tenha tempo de realmente aproveitar cada momento. Ando meio cansada. Na verdade, bem cansada. Física e psicologicamente. Voltei aqui porque lembrei que escrever me faz bem. Escrever aqui me isenta de julgamentos imediatos e direto. Me isenta de explicações que eu não quero dar, e de justificativas que eu não tenho que inventar. Queria a vida mais leve, mais solta. Mais feliz. Menos atribulada e apressada. Queria umas férias de tudo e de tudo, viajar sozinha para um lugar desconhecido em busco de algo que em mim se perdeu. Um pouco de paz. 

Day by day.

Me perguntaram outro dia, se eu era feliz sozinha. Respondi só com um sorriso. (Idiotice!) Nessa vida me rendi a felicidade que é ter amigos. Sobretudo, do peito, para dividir a leveza da vida. Poderia então dizer – simplesmente – estou acompanhada. Por vários. Tenho amores de todos os tipos. Para todas as horas.

Day by day.

Sobre a minha avó

A vida corrida nos priva de tantas coisas simples e boas. Coisas que se findas, jamais regressarão. Dia desses enquanto minha avó me contava uma história sobre a qual eu não faço ideia do que se trata, vaguei em suas rugas e marcas. Percebi o tanto de tempo que eu estive fora e não acompanhei o teu passar dos anos. Tive medo.

Uma vez eu li que avós que criam seus netos deixam uma marca na alma. A minha avó me criou. E além dos seus olhos que carrego em mim, ela sempre estará comigo em meu coração.

Ela tem 65 anos. É velha, dolorida. Olhando velhas fotografias acredito que foi uma das moças mais bonitas do seu tempo.

Não sabe ler direito. Tem as mãos grossas, pés maltratados. Carregou na cabeça toneladas de lenha… baldes de água. Vê nascer o Sol todos os dias.

Contou-me histórias de aparições e lobisomens, velhas brigas de família, um crime que resultou em morte.

Trave da sua casa, lume da sua lareira – dezessete vezes engravidou, mas apenas cinco vezes deu a luz.

Não sabe nada do mundo. Não entende de política, nem de economia, nem de literatura, nem de filosofia, nem de religião.

Traz um legado de centenas de palavras práticas e um vocabulário peculiar.

E com isso viveu, e vai vivendo.

Sensibiliza-se com as catástrofes do mundo e também com os casos da rua. Tem grandes ódios por motivos que já não lembra, grandes dedicações que não levam a lugar nenhum.

Vive.

Para ela a palavra Vietnã é apenas um nome feio que não condiz com seu círculo que tem apenas alguns quarteirões de raio.

Da fome conhece algumas coisas. Viveu na pele os efeitos de tamanho inimigo que não deixa que o adversário tenha forças para se defender.

Será que isso ela me contou ou eu sonhei que me contou?

Leva consigo o seu pequeno casulo de interesses. E no entanto, tem os olhos claros e, de certa forma, é alegre. Teu sorriso é como um arco-íris de cores. Como ela não conheço ninguém.

Fico diante dela e não entendo. Sou da sua carne e do seu sangue, mas não entendo.

Veio a esse mundo, mas não procurou saber o que é o mundo.

Chegou ao fim da vida, e o mundo ainda é para ela, o que era quando ela nasceu. Uma interrogação, um mistério inacessível, uma coisa que não faz parte da sua herança. Quinhentas palavras e um quintal que em cinco minutos se dá a volta.

Aperto sua mão cheia de calos, passo minha mão no seu rosto enrugado e pelos teus cabelos que deviam ser brancos, mas que ela teima em pintar, e continuo a não entender.

Foi muito bela, eu disse. E eu bem vejo que tem certa 
inteligência.

Por que foi então que te roubaram o mundo?

Mas disto talvez entenda eu, e até me proporia a te dizer o como, o porquê e o como se soubesse escolher das minhas inúmeras palavras aquelas que te fizessem compreender.

Mas não vale a pena.

O mundo continuará sem ela… e sem mim.

Não teremos dito uma a outra o que mais importava. Não teremos, realmente?

Eu não terei te dado, porque minhas palavras não são as suas, o mundo que a ela era devido.

Fico então com esta culpa da qual ela não me acusa, e isso ainda é pior.

Mas porquê, vó?

Por que senta na sua varanda e olha para o céu estrelado e imenso se dele nada sabe e por ele nunca viajará? Olha ara o silencio da imensidão e diz com a tranquila serenidade dos seus sessenta e cinco anos e o fogo da adolescência nunca perdida: O mundo é tão bonito, e eu tenho tanta pena de morrer.

O mundo é tão bonito, e eu tenho tanta pena de te perder.

E é isso que eu não entendo.

Mas a culpa não é dela.

Pensamento soltos traduzidos em palavras.

Breve retorno

Estive ausente. Encontrei um lar nos braços de uma garota que passou a ser a minha vida. Vivi um sonho. Estava feliz. Mas obviamente tudo tem que desandar um pouco ao longo do caminho. Não, não foi um término, mas fomos separadas. E talvez a dor de não ter ninguém por não conseguir querer alguém, seja infinitamente inferior a não ter quem se quer. Nós não conhecemos mesmo os nossos sentimento e menos ainda nós mesmos até que somos colocados a prova. Farei dessas linhas o meu consolo, e por aqui estarei. Só não sei ainda por quanto tempo. 

Day by day.

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Hoje me submeti a uma entrevista para iniciar a caminhada rumo a um dos muitos projetos que eu tenho em mente. A entrevista foi feita por duas moças, que iriam fazer peguntas pontuais, esperava eu. Assim que entrei na sala, havia uma moça sozinha, de pernas cruzadas, com um prancheta na mão que sorriu ao me ver entrar.
 
Antes que eu pudesse me ajeitar na cadeira, fui surpreendida com um “Quem é você?”
 
Prontamente respondi:
 
– Sandrelly, auxiliar de escritório…
 
Antes mesmo que eu pudesse concluir qualquer possível raciocínio sobre quem eu acho que sou, fui surpreendida:
 
– Não! Quero saber quem você é, não o que você faz.
– Nossa é muito difícil responder essa pergunta, não sei se confio em você a ponto de te mostrar quem eu sou.
– Você não confia em mim ou não se conhece tão bem a ponto de me mostrar quem você é?
 
Eu me senti apreensiva. Era uma conversa ou uma consulta com o psicólogo? Pensei um pouco e respondi:
 
– Eu escrevo.
 
Meu interlocutor olhou-me com uma cara de “todo mundo escreve, minha prima de 5 anos escreve”.
 
– Não entendi.
– Eu escrevo. Tipo, escrevo. Sento, penso, sinto e escrevo.
 
Quanto mais eu dizia “eu escrevo” maior era a confusão que se instalava em seu rosto. Então, eu abri meu notebook, mostrei-lhes alguns textos, umas frases soltas, abri meu blog, e depois de um tempo parada de frente pro computador, ela me olhou com os olhos marejados e me deu um abraço.
 
A segundo moça entrou na sala, sentou na cadeira a minha frente, pegou sua prancheta, e disse:
 
– Vamos lá, Sandrelly, quem é você?
 
Antes que eu pudesse dizer qualquer coisa, a moça que estava sentada ao meu lado, ainda enxugando um pouco de suas lágrimas, disse:
 
– Ela escreve.
 
E então eu completei:
 
– E tem gente que lê!
Pensamento soltos traduzidos em palavras.

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Eu perdoei todas as pessoas que de alguma forma me fizeram mal, perdoei mais do que elas mereciam serem perdoadas. Perdoei mesmo sem um pedido de perdão. O fiz por vontade e necessidade do meu coração, ele pedia paz. Esqueci as mágoas, os danos, as dores. Dei para elas a maior de todas as vinganças, os meus mais sinceros desejos de felicidade.

Nesses dias, descobri que uma certa pessoa, do qual eu nunca desejei mal algum, pelo contrário, sempre fui gente boa demais, em uma certa ocasião falou mal de mim ao extremo, sabe o que eu fiz? Relevei, na verdade nem perdi meu tempo, simplesmente não quis saber, sai e deixei para lá.

Não sou a melhor pessoa do mundo, é verdade, eu sou péssima. Porém tenho acreditado cegamente na lei do retorno, acho mesmo que tudo que vai, volta. Para toda ação a vida te trás uma reação. Por isso eu ando mesmo desejando o melhor para todos, quero um futuro livre, lindo, brilhante e repleto de assas coloridas.

Quanto mais o tempo passa, mais a minha lista de amigos diminuí, em menos pessoas confio e conto nos dedos as que amo de verdade.

Essa semana em uma reunião com uma cliente ela sorriu quando eu disse: – Vou fazer uma lista de pessoas que devem comparecer ao meu enterro. Só é para ir quem for convidado. Ela sem entender perguntou: Por quê? Eu respondi: – Na vida, você só pode compartilhar as alegrias e as dores sinceras, com quem foi verdadeiramente leal.

Não sei se é a chegada da terceira década, se eu estou mais chata ou se as crises de tristezas andam mais efetivas, mas me tornei uma pessoa extremamente sincera, realista e calma.

Se me permite uma dica, faça o mesmo que eu, se liberte de qualquer mal, ódio, rancor e sentimentos ruins. Deixe sua alma livre, pare de desejar o pior, afinal, isso e falar mal do próximo não vai tornar sua vida mais leve.

Boa prática.